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O uso de tecnologias de digitalização e automação como a solução para a otimização de processos passa a ser atrelada aos sistemas de comunicação crítica utilizados entre equipes e entre elas e os consumidores.

Ao final da década passada, a palavra de ordem na evolução do setor elétrico eram os famosos D’s: descarbonização, descentralização e digitalização. O consumidor no centro das decisões chegou a ganhar o neologismo prosumidor que sintetizava a trilha da energia a ser perseguida pelas empresas que atuavam no setor.

Com uma matriz de energia elétrica majoritariamente limpa e renovável, principalmente em decorrência do imenso potencial hidrelétrico brasileiro, e com a disseminação de recursos energéticos descentralizados por meio da crescente instalação de micro e minigeração distribuída (MMGD), o setor elétrico brasileiro conseguiu avançar na descarbonização e na descentralização. Entretanto, a revolução 3D foi lenta, gradual e ainda engatinha no Brasil, em virtude da não abertura de mercado de baixa tensão à competição, principalmente quando se fala sobre tecnologias de digitalização e comunicação.

As mudanças enfrentadas são desafiadoras, principalmente na operação do sistema, com a crescente inserção de fontes renováveis intermitentes, ou no âmbito do desenho do mercado de energia elétrica, na abertura do Ambiente de Contratação Livre (ACL) para os consumidores conectados em alta tensão e a promessa da portabilidade da conta de luz para os consumidores supridos em baixa tensão, principalmente residenciais.

Em paralelo, os agentes setoriais precisam lidar com uma frequência cada vez maior de eventos climáticos extremos que deterioram as instalações elétricas, notadamente as redes de distribuição, que necessitam operar em regime contínuo para manter a performance satisfatória dos serviços essenciais de energia elétrica, o que possibilita o pleno funcionamento da atividade econômica.

Se por um lado a revolução 3D beneficia e empodera o consumidor, por outro lado traz desafios para as empresas no atendimento de clientes cada vez menos tolerantes a falhas e interrupções no fornecimento de energia elétrica, uma vez que o insumo eletricidade ficou indispensável para a realização das mais simples às mais complexas atividades do dia a dia.

A eficiência operacional das empresas e dos órgãos de monitoramento e controle do sistema estão cada vez mais em cheque pela sociedade, o que passa a incluir a necessidade de comunicação de qualidade em tempo real com os consumidores. Para isso, o uso de tecnologias de digitalização e automação como a solução para a otimização de processos passa a ser atrelada aos sistemas de comunicação crítica utilizados entre equipes e entre elas e os consumidores.

Muito comum no mercado financeiro, a comunicação crítica é destinada às operações técnicas, comerciais e transacionais de elevada complexidade que exigem segurança, confiabilidade, eficiência e sigilo em todos os elos da cadeia do complexo processo de comunicação, sendo fundamental para operações de geração, transmissão, distribuição e, com a abertura de mercado, também para comercialização de energia elétrica.

As soluções tecnológicas possibilitam uma comunicação ágil e eficiente entre equipes de campo e centros de controle, garantindo o compartilhamento instantâneo de informações críticas. Com o uso de redes seguras, sensores IoT (internet das coisas) e plataformas integradas, os operadores podem monitorar a rede em tempo real, enviar ordens de serviço automatizadas e receber atualizações sobre o status das operações, bem como comunicar com registros seguros e auditáveis os eventos em tempo real aos consumidores.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) também tem demonstrado preocupação com temas atinentes à digitalização, comunicação e segurança cibernética. Umas das mais recentes Notas Técnicas da ANEEL (NT 1/2025), que resultou na abertura da Consulta Pública (CP) nº 007/2025, trata sobre aprimoramentos regulatórios dos serviços de distribuição e tem como foco: automatização do processo de migração ao ACL, disponibilização de informações da fatura de energia elétrica em formato digital, implantação de mecanismo para o compartilhamento seguro dos dados dos consumidores (Open Energy) e estabelecimento de canais de atendimento entre consumidores e a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).

Dentre esses temas, no âmbito da comercialização de energia elétrica, o Open Energy apresenta-se como um dos mais desafiadores, afinal a integração de sistemas via API (Application Programming Interface), conforme previsto na regulação sugerida pela Agência Reguladora, exige infraestrutura robusta de comunicação crítica, garantindo confiabilidade, disponibilidade e rastreabilidade do compartilhamento dos dados, incluindo mecanismos de auditoria contínua e controle de acessos, assegurando que todas as interações realizadas no sistema sejam monitoradas e registradas de forma transparente e segura. Camadas extras de segurança são aplicadas no setor financeiro, por exemplo, por meio do FAPI (Financial-grade API), protocolo desenvolvido especificamente para garantir maior segurança aos processos do Open Banking, que será indispensável ao Open Energy quando implantado.

Já no âmbito dos serviços de distribuição e transmissão de energia elétrica, a necessidade de intervenção regulatória associada ao aumento da resiliência do sistema de distribuição e de transmissão a eventos climáticos extremos está sendo tratada por meio da CP nº 32/2024. Até o momento, estudos realizados pela Agência (NT n° 90/2024 e 101/2024) apontam como fundamental a implementação de canais de comunicação eficientes e seguros não somente entre equipes, mas também com os consumidores, prefeituras, governos, defesas civis e salas de crise.

Por fim, a expectativa é de que os apontamentos e diretrizes observados nas análises da ANEEL transformem-se em Resoluções Normativas que deverão ser seguidas pelos agentes setoriais, principalmente geradoras, distribuidoras, transmissoras e, agora, comercializadoras que talvez ainda não tenham percebido a relevância do tema para conquistar mercado.

Créditos do texto RAD Energia: Reginaldo Medeiros é CEO da RAD Energia. Foi Secretário de Energia Substituto do MME, executivo de várias empresas e instituições e consultor independente do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Amanda Almeida, 25a, é Engenheira de Energia pela UNB e Analista de Regulação da RAD Energia.

Matheus Lobo, 26a, é Engenheiro de Energia pela UNB e Analista de Regulação da RAD Energia.